É comum
sermos abordados por alunos, aspirantes a empreendedor e interlocutores que
mencionam ter uma ideia de negócio dizendo que a dificuldade é ter o dinheiro
suficiente para desenvolvê-la. Muitos já até trabalharam nos seus modelos de
negócios, acreditando que têm diferenciais em relação a seus concorrentes, que
seu "negócio" é muito promissor.
Há até os casos em que, seguindo à risca a lição superenfatizada
do plano de negócio, afirmam que o negócio é viável, dará grande retorno, com
prazo de retorno do investimento bem curto! Comumente pretendem encontrar
investidores-anjo ou mesmo investidores de capital de risco para seus
"negócios".
Entre potenciais empreendedores universitários, é muito raro
ver-se casos em que o produto ou o serviço já esteja sendo vendido aos clientes,
ou que os nossos jovens empreendedores tenham feito incursões comerciais
procurando vender, captando os primeiros compradores bem como as suas reações a
seus projetos e produtos.
No Brasil, como nos EUA, é muito mais frequente que os negócios
sejam iniciados com dinheiro próprio, dos familiares e amigos. Ainda mais que o
cenário que se tem aqui é de dinheiro alheio muito caro. Assim, é muito
saudável que os empreendedores aprendam a disciplina do
"bootstrapping" e também encontrar formas de erigir e fazer rodar o
seu negócio com o dinheiro do cliente.
Este termo da língua inglesa provem daquela tira de couro na
parte de trás da bota, sobretudo as de cano alto, que permite que o seu dono a
calce sem ter que pedir ajuda a terceiros. Analogamente a expressão bootstrapping
passou a significar, no contexto de administração de empresas e de
empreendedorismo, ser capaz de se erguer a partir dos próprios recursos e
esforços.
Deste modo, esses empreendedores usam desde os seus próprios
computadores, a garagem, a cozinha ou o quarto de casa, pedem para usar
recursos de outros – máquinas, equipamentos, ferramentas – para poder
concretizar seus produtos.E prosseguem pedindo que futuros clientes sejam os
primeiros a testá-los. Idem para os serviços.
Mais recentemente, diversos autores chamam a atenção para a
necessidade de que os empreendedores, desde o início, testem logo as suas
ideias, levem seu projetos, protótipos e produtos cabeças de série para a
avaliação de seus clientes ou quem mais possa agregar reações a eles. E quanto
antes partirem para vender seus produtos e serviços melhor.
Mesmo que ainda não completamente desenvolvidos, com todas as
características, ou com melhorias de design etc. é muito melhor aproximar-se do
cliente e mercado reais do que ficar conjecturando e adiando esta prova dos
nove.
Outros autores indicam várias formas de fazer o negócio rodar
com o dinheiro do próprio cliente. Um destes é John Mullins, ex-executivo e
empreendedor, que atualmente é professor e pesquisador da London Business
School (Inglaterra).
Em seu livro de 2014 – The Customer Funded Business (negócios
financiados pelos clientes), um enorme sucesso de vendas na Amazon, ele
apresenta 5 maneiras de capturar o dinheiro dos clientes.
A primeira delas é o pagamento antecipado, que é muito comum
sobretudo na área de serviços – consultoria, marcenaria, arquitetura, produtos
e projetos sob medida, bufês etc. Assim, o cliente paga percentuais variados
sobre o montante do produto ou serviço e o empreendedor ganha o gás de que
necessita para comprar matérias primas, adquirir ou alugar equipamentos,
engajar pessoas etc.
Quando o produto ou serviço é finalizado e entregue, recebe-se
parte do restante ou o que falta para integralizar o total da venda.
A segunda forma é construir uma maneira pela qual quem tem o bem
ou é capaz de atender à necessidade do cliente se encontrem e acertem a compra.
Deste modo o empreendedor ganhará pela viabilização deste encontro. Exemplos do
exerior são E-Bay, Expedia, Airbnb. No Brasil tem-se os casos da B2Blue
(plataforma de venda e compra de resíduos sólidos), Mercado Livre, Portal
Noivas, SlideTown entre outros.
A terceira é o modelo de assinatura. Ou seja, o cliente concorda
em pagar periodicamente determinado valor para obter certos produtos, serviços
ou benefícios. Tipicamente as revistas, jornais, provedores de internet e de canais
de TV seguem-no. Mas, tem-se uma variedade de clubes de vinho, cervejas,
cosméticos, pães, flores, fraldas, rações; ou de serviços de manutenção de
plantas e jardinagem.
A quarta maneira é o da escassez, muito utilizado no varejo.
Como bem faz a Vente Privee (francesa) que seleciona roupas, acessórios,
brinquedos, artigos para casa, artigos esportivos etc. de grandes marcas e os
oferecem em vendas exclusivas. Ou da Zara (espanhola) cujas coleções de roupas
são produzidas em pequena quantidade. Assim, o cliente fica com a sensação de
ou compra agora ou perde a chance!
A última maneira de obter dinheiro do cliente é vendendo
projetos e soluções customizadas ou prontas para o uso. Deste modo os serviços
são transformados em ou empacotados como produtos.
Tal como fez a Microsoft ou a Goviral que oferece diversas
soluções para a criação de conteúdos em video, artigos inspiracionais, galerias
de imagens que auxiliem profissionais de propaganda e da área de publicações a
realmente se connectar com o seu público.
Mullins conclui que o empreendedor deve examinar se e quais
destes modelos podem ser aplicados ao seu caso. Se puder utilizar o dinheiro do
cliente será muito mais fácil criar e fazer crescer o seu negócio. Aí sim, ante
o sucesso, vai ser a vez dos investidores virem atrás de você, pois de fato
terá um negócio real nas mãos, testado e avalizado pelo mercado.
Fonte: UOL Notícias